Torno foi escrito ao longo de alguns anos. Nele, desvela-se um caminho em espiral que enfim sai da gaveta. Poema a poema. Convido você, leitor, a abrir comigo esses cadernos, sempre incompletos. Os anos de escrita se farão semanas de leitura, condensados no tempo. Coincidência ou não, o ciclo começa hoje, oito de março.

segunda-feira, 10 de março de 2014

                                  Interlúdio I



O porão da casa velha, conhece? É o lugar pior do mundo. Cheira a mofo de terra, de terra onde nunca se enterrou ninguém, terra mais só. Lá guardei uma caixinha trancada, de ferro para o fogo nunca destruir, e vou morar dentro da caixinha. Vou entrar e dormir, dormir até o mundo nascer de novo. Dessa vez não vou ser eu quem vai parir, porque da outra vez não tive forças e morremos, eu e o mundo nem nascido. Dessa vez vou nascer também, sem esforço, sem dor, sem escolha. Que não me falte também o ar.

De vez em quando dou uma olhada pela fechadura da caixinha, embora dormindo, porque tenho medo de o mundo nascer sem mim. Mas não há perigo. Também por isso a caixinha é de ferro: quando ela se misturar à terra do mundo, eu vou nascer, viva, viva, e também serei terra. Com pavor a vasos de flor.

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